Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
Às vezes, travo.
O romance fica parado por meses.
A peça de teatro cai no fosso do palco.
O conto vira conto do vigário
E a crônica parece ter fugido para sempre.
Nem me fale de poemas. Esses então, andam mais desaparecidos do que ouro em pó.
Por que ouro em pó? Ora, leitor, use sua imaginação e não me atormente!
O que faz um escritor escrever? Qual a história que ele ainda não contou? Nesses momentos, em que nem uma letrinha parece boa o bastante, imagino que as combinações alfabéticas já terminaram e que nem adianta eu ficar ali, olhando aqueles símbolos que insistem em não querer se casar. Não se amam! Fazer o quê??
Será que minha sina de escriba foi escrita pelo tal Todo Poderoso? Se foi, sinto muito, mas tenho de lhe confessar: Ele também não escreve muito bem.
Passeio pela casa, tomo um café, arrumo qualquer coisa, esperando a famosa inspiração chegar. Devo contar que ela está bem atrasada. Talvez tenha perdido o trem. Já me disseram que esses trens vivem lotados e vire e mexe também quebram. Talvez ainda tenha tomado o trem errado e ido passear por aí. Já percebi que ela, às vezes, faz coisas malucas só pra me irritar.
Resignada, resolvo esperar pela fugitiva em frente à tela em branco. Na falta do que fazer, escrevo a bronca que vou lhe dar assim que a vir:
"Como assim, me deixa aqui esperando, preocupada que algo tenha lhe acontecido? E se alguém tivesse lhe sequestrado? E se você tivesse morrido? O que seria de mim? Nunca mais faça isso. Telefone dizendo que vai se atrasar. Ou melhor, não se atrase nunca mais. Leitor é compreensivo, mas não é tolo. Nem sempre vai acreditar nesse monte de desculpas esfarrapadas!"
SP 09/05/2023