
Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
ADEUS

Às vezes, a finitude resolve passear pela minha vizinhança. Vem buscar um amigo de infância, um parente, uma pessoa querida. Gostaria de mandá-la embora, dizer que ainda é cedo e que há muita gente com mais estrada rodada, pronta para mudar de ares, mas dona finitude não quer saber de nenhum argumento. É poderosa e decide quem vai e quem fica, sem qualquer explicação.
Depois que ela passa, eu fico me perguntando por quê? Sei que é uma pergunta sem resposta, mas isso não me impede de pensar e pensar.
Lembro-me de uma fonte de luzes coloridas. Ela era muito grande para um corredor tão estreito, mas éramos crianças e a fonte com suas luzes, que mudavam de cor junto com o movimento da água, nos encantava.
Lembro-me das brincadeiras, de intermináveis conversas nos muitos recreios, de viagens, de andar de ônibus lotado em idas e vindas da escola e de um dia conhecer seu primeiro namorado. Parece tão distante e tão perto que quase consigo tocar.
Também era você que estava comigo quando conhecemos aquele que viria a ser meu marido. Foi com você que ele falou primeiro. Lembra? Claro que você não lembra. Não pode. Você se foi.
Ainda uso todos os dias, a jarra que você deixou aqui em casa para fazermos as famosas mimosas! Não quis levar embora, me deixou de presente. Como bebemos, e rimos, e relembramos naquele dia. Que bom o reencontro de amigas de infância que tomaram caminhos tão diferentes, mas que a longa convivência marcou a ferro, valores que não se alteraram ao longo da vida. Esse era o ponto em comum.
As fotos dos encontros e dos reencontros ganham minhas mãos. São bonitas de se ver. Estamos sorrindo, felizes, celebrando a vida.
Que pena que criamos distâncias depois!
Não sei para onde a finitude te levou. Torço para que seja um lugar mais radiante e sem dor. E que, de vez em quando, você possa vir por aqui assoprar algo bom em nossos ouvidos, habitar nossos sonhos, passar correndo por nossos pensamentos, distribuir aromas e fé.
SP 22/10/24