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AMNÉSIA COLETIVA

           Quem me conhece sabe que adoro elefantes! Tenho vários.

       Entretanto, tenho um elefante de pelúcia, grande, ganho de um amigo querido. E, justamente por ser tão grande, não fica junto com os outros, mas sentado confortavelmente na cadeira, em frente à minha mesa de trabalho. Toda vez que levanto os olhos da tela do computador, encontro os olhos do meu elefante.

         De vez em quando, conversamos! Ele é um bom ouvinte. Como é elefante, jamais se esquece de algo, e o melhor, sempre me mostra a verdade.

         Conto a ele da minha desesperança, de como os brasileiros se esqueceram rápido de tantas pessoas que morreram porque não foi feita a compra de vacinas no momento correto, e meu elefante me pergunta, inconformado com a minha inocência:

         - Você não sabe que as pessoas são egoístas e só se preocupam com as suas próprias vidas? Quem liga pra quem morreu, ou pior, para quem as matou?

        Lembro do ódio aos negros, e o meu elefante, muito mais inteligente do que eu, me diz:

        -A escravidão acabou, mas muitos brancos ainda gostam de se pensar donos de escravos. Suas empregadas domésticas, seus jardineiros e motoristas quase sempre são negros e seus patrões os consideram menor, sem direito a ir para a universidade, viajar de avião ou comer em restaurante de branco. Torcem o nariz quando os veem ocupando esses lugares. Não querem que essa nova escravidão, feita de salários de fome, termine. – meu elefante completa.

        Insisto. - Mas e o desprezo pelas mulheres? Meu elefante ri da minha pergunta.

          -Desde quando mulheres têm alguma importância? – ele retruca.

        - Pensei que tivesse. - eu respondo inocente. Afinal, somos a maioria da população.

        - O que adianta uma maioria que não se dá valor e vota em homens que acham que elas não valem nada? Que podem ser estupradas se não forem feias? Que feminicídio é mimimi? Que mulher tem de estar sempre bonita, ficar de boca fechada e, de vez em quando, até levar umas pauladas para aprender o seu lugar? 

        Abaixo a cabeça. Meu elefante como sempre tem razão. Poderia falar dos homossexuais, mas sobre eles, até eu sei a resposta. Uma sociedade ignorante, retrógrada, acha que gays são doentes e devem ser exterminados ou ficarem em redutos bem escondidos.

         Ainda mais desesperançada, pergunto: - Algum dia isso vai mudar?

         Meu elefante me olha com pena.

      - Somente com empatia e educação para todos, mas, se até aqueles que se dizem professores votam contra a educação, não vejo saída.

       Abaixo os olhos.  É muito triste! Um elefante com memória pode enxergar muito mais do que meus compatriotas!!

           

SP 11/10/22

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