
Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
APAGÃO

Estamos vivendo um apagão geral e não estou falando apenas de falta de luz que parece que virou rotina do paulista. Estou falando de um apagão de coisas boas e de pessoas geniais.
Há quanto tempo não aparecem artistas do nível de um Chico, de um Caetano, de um Gil? O que aconteceu? Nossa música empobreceu? Ou será que alguém apagou o talento?
Por onde andam os herdeiros de Machado, de Drummond, de Clarice ou de Guimarães? Passaram a borracha nas letras, apagaram as ideias?
Li em algum lugar que essa geração que está aí é a primeira em décadas que não é mais inteligente do que a geração anterior. Os especialistas dizem que é uma consequência do uso exagerado do celular. Acenderam as telas e apagaram a inteligência?
Se for assim, se a cada geração a humanidade retroceder um pouco, talvez em alguns séculos, voltará a morar em cavernas. Ainda bem que não estarei por aqui para ver. Não gosto de cavernas.
Mas não é apenas intelectualmente que estamos sendo apagados. Onde foi parar o sorveteiro que passava na minha rua? O que aconteceu com os encontros frequentes de família? Parece que rarearam tanto, que quando um acontece vira grande acontecimento. E bastava apenas um café quentinho e um pão de queijo para gente se encontrar e o papo rolar solto por horas.
Nunca mais vi ninguém vendendo machadinha na porta de uma escola. Aliás, é bem provável que a grande maioria nem saiba do que estou falando. Vou explicar: machadinha é um doce puxa-puxa. Não é um machado pequeno.
Não há mais balanços nas praças. Não ouço crianças gargalhando. Não vejo adolescentes só rindo e conversando sem olhar para uma tela. Não encontro casais de mãos dadas exalando felicidade. Não sinto paz e igualdade se impondo no mundo.
Sinto falta de tanta coisa! É como se um tempo feliz inteiro fosse se apagando aos poucos e, quando a gente percebe, ele se foi.
E não dá nem para colocar a culpa na Enel.
SP 15/10/24