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CLIC!

          Clic! Era assim que se registrava a vida antigamente. As câmeras faziam o barulho e aquele momento estava eternizado para o bem ou para o mal.

          Só depois de alguns dias, quando o filme fosse revelado é que o fotógrafo iria saber se havia conseguido captar o seu desejo. Muito filme foi queimado, muito dinheiro gasto em filme e revelação, muita raiva foi passada quando se recebia o pacote de fotografias borradas, tremidas, completamente inúteis.

          E quando as fotografias vinham trocadas? Certa vez, tirei dezenas de fotos de alunos meus em um final de ano letivo. Era meu último ano naquela escola e queria registrar tudo para guardar de lembrança. Qual não foi minha surpresa, quando abri o pacote das fotos e era de uma festa de 40 anos de alguém que nunca voltou ao estúdio de fotografia para desfazer a troca. Lá se foram meus alunos para uma casa em que ninguém os conhecia, enquanto fiquei com uma festa para a qual não fui convidada.

          Entretanto, nem tudo foram espinhos, muito pelo contrário. Tenho caixas e mais caixas de fotografias tiradas ao longo de muitas décadas que me entretém por horas quando resolvo vê-las, além das dezenas que habitam os porta-retratos. É uma delícia pegar o passado na mão. A materialidade o torna tátil e mais real.

             Atualmente, tudo mudou. Se por um lado, hoje tiramos dezenas de fotos da mesma coisa sem gastar um real e sabemos na hora qual será aproveitada, por outro lado confiamos tanto na memória do celular, do computador ou da nuvem, que nenhuma foto é impressa. As estantes vão ficando vazias ou antigas. As mesas da sala parecem que não são de ninguém. Nenhum registro exposto pela casa, mostrando um momento feliz para as pessoas admirarem.

          Parece que as fotos se popularizaram tanto pelos celulares que perderam seu valor mais intrínseco que é estar pelos cantos para não nos deixar esquecer daquele momento extraordinário que passou. Se não for um movimento consciente de busca por uma determinada foto, o momento pode ficar preso no fundo de uma memória digital, ou pior, se perder junto com o equipamento.

          Com o correr do tempo, sei que o papel amarela, amassa, se rasga, mas durante anos e anos esteve ali firme no seu papel de papel, ofertando aos nossos olhos em qualquer dia, sem que sequer pedíssemos, a beleza daquele instante que não voltará jamais, nos lembrando daquele amigo, daquele irmão, quase nos guiando ao telefone para pedir notícias.

          As fotos faziam parte da mobília, da casa, do dia a dia, da vida e influenciavam nosso viver.

          Clic! Era muito mais do que tirar uma foto.

SP 03/12/2024

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