Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
DE NOVO
Leio sobre a nova cepa africana, a tal Ômicron, e algo aperta lá dentro. Será que vamos começar tudo de novo? Perdemos ou adiamos quase dois anos de vida com a esperança de que agora, tudo estaria chegando ao fim. Mas será que não há fim para essa pandemia?
Toda vez que falo isso, alguém me repreende. Afinal estou viva e não faço parte da triste estatística de mais seiscentos mil brasileiros mortos. Sei disso. E sou infinitamente grata pela vida, mas até quando essa será a nossa vida?
Ouço na tevê uma renomada infectologista falando sobre a nova cepa e recomendando cautela. Mais? Faço parte do grupo que acredita na ciência, que carrega álcool em gel para todo lado, usa máscara e pede para os próprios filhos fazerem quarentena antes de virem me ver. Não dá pra pedir ainda mais. A não ser fechar, à chave, a porta de casa e esquecer que, lá fora, existe gente que amamos.
Pessoas são o meu combustível. Só sou feliz com gente ao meu redor. Amadas ou desconhecidas. Passo horas sentada em uma mesa de café ou de bar observando simpáticos estranhos, imaginando suas vidas, desenhando histórias imaginárias que depois ganharão concretude no espaço em branco desse computador. Histórias e histórias. Preciso delas.
É por isso também que viajar faz parte do meu DNA. Quando penso em todos os lugares que não conheço, ou conheço e quero muito voltar, sem saber se isso será possível, fico imensamente triste. Sei que parece ridículo e que viajar é um luxo, quase um supérfluo. Entendo que seja assim para a grande maioria de pessoas, mas para mim é essencial. Viajar para novos cenários, conhecer gente com outras culturas, expande meu horizonte, torno-me alguém mais flexível, pronta a aceitar que nem todo mundo é igual ou gosta das mesmas coisas. Sou capaz de compreender melhor as dores dos outros que me cercam.
É preciso ter uma escuta significativa para entender o que um caipira do interior de Goiás está lhe ensinado quando fala dos passarinhos ou, da mesma maneira, o porquê de um Níbio, do meio do Saara, exibir seu ouro em uma casa tão simples. Pessoas são frutos de lugares, de culturas tão díspares quanto fantásticas. Sou capaz de me emocionar até as lágrimas andando pelas ruas carregadas de história de Ouro Preto, como sou capaz do mesmo modo, ouvindo os violinos da pequena Bruges, na Bélgica. Lugares não são nada sem gente. São as pessoas que fazem os lugares.
Enquanto o mundo aguarda o que essa nova cepa nos reserva, sonho. Estou em Marrakech, ou melhor, pra lá de Marrakesh...olhando as lindas marroquinas.
São Paulo, 07/12/2021