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        DE NOVO, O FRIO

         

       Detesto o frio. E já devo ter dito essa frase um milhão de vezes. Por mais que me esforce para pensar em uma lareira com um lindo fogo, um chocolate quente e um cobertor xadrez, tudo igual de filme, nada disso, que é tão bonito, me conforta o suficiente para eu esquecer que... detesto o frio.

         Repetitiva? Sim. Se o frio é repetitivo, por que eu não posso ser?

        Chego a pensar que o aquecimento da Terra é uma balela. Uma grande conspiração de cientistas, esses mesmos que insistem em afirmar que a Terra é redonda. Sorrio da bobagem pensada em voz alta. Nem todo o frio do mundo vai me fazer ir contra a ciência. Nessa nossa época, com tantos malucos que insistem em reviver o período das trevas, é melhor nem brincar com essas coisas.

        Entretanto, esse aquecimento tão desastroso para o planeta, não chegou a São Paulo que insiste em ficar entre os 8 e 11 graus. Minhas mãos e meus pés, garanto, estão abaixo de zero. Não consigo aquecê-los por mais que tente.

          O banho é um suplício. Se abro demais a torneira, a água esfria. Se fecho, a água quentinha vira apenas um fio, que mal cobre uma parcela ínfima do meu corpo, enquanto o resto congela entre os azulejos. Tento escolher a hora do dia que o banho seja um sacrifício menor. Está difícil. Definitivamente, o prazer do banho fica para o verão.

          Na hora do jantar, a sopa fumegante é um colírio não só para os meus olhos, mas para todos os outros sentidos também. Mas, os dois minutos que dispenso para atender um telefone que toca na hora errada é o suficiente para esfriar a sopa que fica morna em um piscar de olhos.

         A única coisa que me conforta nesse frio dos infernos é a minha cama. Meu pijama de flanela é a coisa menos sexy que já vi na vida, mas sorrio só de vesti-lo. A comprida meia de lã, que eu sobreponho por cima da perna do pijama, garante que nenhum friozinho vá conseguir atravessar e chegar à minha pele. Para completar, uma cobertura de três grossos cobertores. E pronto. Finalmente, sinto um pouco de conforto.

          De madrugada, acordo embaixo dos muitos cobertores com vontade de ir ao banheiro. Não acredito em tal coisa. Viro para o outro lado, finjo que não estou sentindo nada. Tento desesperadamente dormir novamente. Não tem jeito. Levanto e enfrento o frio, agora ainda mais frio.

         Aviso a todos. Se alguém disser para mim que gosta de frio, sou capaz de cortar relações.

 

                                São Paulo, 25/08/2020

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