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CRÔNICA DA SEMANA









DRUMMOND E EU
 

          Drummond me enviou esse cartão, quando eu tinha apenas 22 anos. O poeta havia feito 80 anos em outubro e eu, por ocasião do aniversário, havia lhe mandado um poema, que eu havia feito em sua homenagem. Eu sabia que ele jamais me responderia. O escritor mineiro já havia afirmado em várias entrevistas que não respondia nem cartas, nem telefonemas e nem nada de desconhecidos. Já tinha até feito um poema pedindo para que lhe deixassem em paz. Mesmo assim, apesar de não esperar resposta, imaginei o grande Carlos Drummond de Andrade segurando o envelope que eu havia subscrito, lendo um poema que eu havia feito... Só isso já era suficiente para a minha felicidade.

         Quando sua resposta chegou em casa, em dezembro, meu coração gelou ao ler o remetente. Com todo o cuidado, abri o envelope com um estilete para que aquela preciosidade não se estragasse. Quando li o cartão em que o poeta dizia ter ficado comovido com meus “lindos versos”, perdi o chão. Apenas duas frases e o mundo inteiro contido nelas. No dia seguinte, ainda estava tão fora de órbita que bati meu fusca. Quase deu perda total. Não vi um farol vermelho.

         Drummond foi meu primeiro e último ídolo. Esse cartão fica guardado em um plástico dentro do cofre. Para mim tem um valor que, obviamente, não é pecuniário. Aos 22 anos, eu vislumbrava com aquele cartão um futuro certíssimo como escritora. Pois é...não foi bem assim. A educação me roubou e a escrita foi sempre intermitente.

           Cinco anos depois, em um 17 de agosto, Drummond foi ao encontro do azul. (Um poeta não morre!!) Talvez nunca tenha sentido tanto o desaparecimento de alguém com quem nunca tivesse conversado, ou tomado café, ou trocado um abraço. Aparentemente, minha relação com Drummond estava resumida a esse cartão, mas só aparentemente. Ainda hoje, toda vez que leio um poema seu, uma crônica sua, ele está falando comigo. Toda vez que me surpreendo com um sentimento inesperado, uma rima rica, décadas depois, o poeta ainda está falando comigo. Com Drummond aprendo a cada dia. Drummond me emociona a cada dia.

            Isso, creio, é ser imortal.

 

            São Paulo, 17 de agosto de 2021.

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