
Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
ESCOLHAS

Acabo de embrulhar o último presente de natal, coloco embaixo da árvore, vejo aquela pequena montanha de caixas e embrulhos coloridos e respiro aliviada. Se não venci a maratona de compras, dias antes, como eu tinha esperança, pelo menos rompi a linha de chegada.
Apesar da sensação de dever cumprido, ainda sinto uma ansiedade difícil de explicar e que só termina depois que as pessoas abrem os presentes e eu percebo pelas expressões de seus rostos que elas gostaram do que escolhi para cada uma. Parece fácil. Para a maioria das pessoas é só chegar nas lojas, escolher e pagar por um presente, mas para mim nunca foi assim. Sou geminiana. Cada escolha é um parto.
Tento ser organizada. Faço a lista dos nomes meses antes do Natal, pesquiso ideias de presentes, leio comentários de quem comprou, tudo isso para descobrir, às vésperas do Natal, que não tenho certeza de que vou agradar. Sou carente e gente carente não devia dar presente. Só de imaginar uma careta alheia olhando um presente escolhido por mim, já me angustia.
Costumo dizer que quem escolhe A, perde B, C, D... o alfabeto inteiro. E isso vale para compras de natal, para o prato escolhido naquele restaurante caríssimo que você nem sabe se vai retornar a ele um dia, para carreira, amizades e até amores.
Talvez, por um único dia, gostaria de viver em um mundo em que não precisasse escolher porque escolher significa se responsabilizar e não poder delegar a culpa a ninguém. Nenhum fracasso tem a assinatura alheia, mas apenas a nossa. Entretanto, meu desejo se exauriria em um dia. Escolher é justamente o exercício da liberdade.
Olho a árvore, os presentes mais uma vez e tento ficar em paz comigo mesma. Fiz o meu melhor. Se alguém não gostar, paciência. Ano que vem tem mais e eu sempre acredito em melhorar, em aperfeiçoar o método. Posso até começar as compras para o próximo Natal, logo em janeiro, vasculhar a internet toda, pedir ajuda à inteligência artificial, consultar os búzios e, finalmente, escolher novamente.
Sempre são escolhas. Lindas, difíceis, amorosas...
Desejo que as escolhas nesse dia 25, nesse renascer que mais uma vez se abre para nós, sejam todas de coração, certas ou erradas, não importa, o importante é ter a coragem de escolher.
SP 17/12/24