top of page

ESSENCIAIS

          Lembro-me de que há muitos anos aprendi a fazer pão. Poucas vezes na vida, me senti tão realizada. Saber fazer pão sempre me pareceu essencial a qualquer ser humano. Não depender de outro para ser alimentado. O pão tem toda uma simbologia, claro, além de ser uma das coisas mais saborosas que existe, mas é mais do que isso, é o alimento básico. Ninguém morre de fome se souber fazer pão.

          Muito tempo depois, aprendi a fazer a massa de cimento. Outro essencial. Sai pela casa tapando buracos, subindo e descendo tijolos. Nunca tentei fazer uma grande parede. Ora, mas sei fazer massa de cimento, e, sendo assim, pelo menos na minha cabeça, o limite é infinito.

        Em algum momento da história deixamos de aprender ensinamentos essenciais como costurar ou cozinhar. Comprar ficou mais fácil, como se fosse uma grande modernidade. Será?

          Hoje em dia, tento resgatar alguns essenciais. Algo que poderia delegar, comprar na esquina, mas que quero aprender a fazer. Pode ser que não saia tão esteticamente perfeito como algo industrial ou tão bom se houvesse sido feito por alguém mais experiente, mas fazer o simples tem de me dado um grande prazer. Posso até nem fazer, mas saber que seria capaz, se quisesse, já me enche de orgulho.

          Fico aqui pensando em tanta coisa que é essencial em nossas vidas. Já imaginou não saber beijar? E não é só saber fazer, mas enxergar. Olhar em volta e perceber o que é fundamental, imprescindível, realmente necessário. Conhecimentos, experiências, objetos, que você não deveria jamais abandonar na estrada.

          Todos os dias, o marketing nos enche de supérfluos, são tantos e tão variados e tão brilhantes que acabamos nos esquecendo do que é essencial, ou pior, substituímos o essencial pelo descartável que não nos aquece a alma. Um buraco sem fim.

        Enquanto escrevo essa crônica, acabo de assar uma fornada de biscoito de polvilho. Mineiríssimo, como minha mãe me ensinou. Assim que sai do forno, o cheiro se espalha. Lembro-me de inúmeros dias felizes da minha infância e adolescência, minha mãe ralhando com os filhos porque queríamos comer os biscoitos ainda quentes. – Vai fazer mal, meninos! Lembro-me de sorrisos e afetos a que nenhum biscoito comprado pronto sem cheiro, sem carinho me remeteria. Essencial!

          Nada substitui o essencial.

 

         São Paulo, 16/08/22

bottom of page