Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
FÊNIX
Ouço no rádio que a cidade de Fênix, nos Estados Unidos, teve temperatura de mais de quarenta e três graus em todos os dias de julho, pelo menos em algum momento do dia. Da mesma forma, também em julho, a mesma cidade não teve nenhum dia com temperatura abaixo dos 32 graus. Imediatamente, lembro-me do ser mitológico.
A Fênix da mitologia era uma ave vermelha e dourada. Reza a lenda que na sua morte entoava um canto triste, queimava-se em autocombustão, mas era capaz de renascer das cinzas.
Já a Fênix, capital do estado do Arizona, sempre foi quente, mas não dessa maneira. Devido ao desmatamento no mundo, o verão de 2023 bateu todos os recordes. Os moradores tinham queimaduras de terceiro grau só de tocar em maçanetas externas e quem sofria com o calor e chegava a desmaiar na rua, também tinha queimaduras horríveis ao cair em um asfalto que chegava a 80 graus Celsius.
Será que o nome da cidade é algum tipo de previsão macabra? Não sei. Só lamento muito a coincidência.
Todos os dias ouvimos falar de um tal de “ponto de não mais retorno” para a Floresta Amazônica. Ninguém falava disso há algum tempo. Sempre achamos que o desmatamento poderia ser consertado. Que sempre seria possível, em um grande esforço coletivo, reverter o estrago. Infelizmente, os ambientalistas nos dizem que não.
Se passarmos do ponto de não retorno, não há mais o que fazer. Vinte e cinco por cento de desmatamento e a floresta não se autorregenerará mais, podendo se tornar um extenso deserto como o do Atacama ou do Saara. Essa floresta que é o pulmão do mundo, que equilibra o clima da Terra.
Os governantes ignorantes, os pecuaristas, as mineradoras, os enormes latifúndios de soja, o contrabando de madeira, ou seja, todos aqueles que derrubam a floresta, simplesmente estão condenando o planeta, como se houvesse um planeta “B” esperando por nós.
Não penso em mim. Já vivi bastante, mas penso nas crianças que daqui 30 anos viverão o inferno sobre a terra, literalmente.
Como a Fênix, a floresta está entoando um canto triste, um último aviso. Entretanto, diferente do ser mitológico, se o pior acontecer, tenha certeza: ela não renascerá das cinzas.
SP 15/08/23