Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
JANE EYRE
Aqui no site, você encontra também a resenha sobre o livro O Morro dos Ventos Uivantes da escritora inglesa Emily Brontë e já deve saber que eu não sou uma grande fã dessa obra. Apesar de reconhecer que tem valor literário, acho um dramalhão. E por que eu estou falando dele então?
Porque o livro de hoje, Jane Eyre, é de autoria da irmã da Emily, estou falando da também escritora Charlotte Brontë. E, quando você tem duas irmãs escritoras, a comparação é inevitável. Entretanto, a narrativa das irmãs era muito diferente.
Vamos lembrar um pouco da saga das irmãs Brontë escritoras. Elas eram em três, a Charlotte era a mais velha, Emily era a do meio, e a Anne era a caçula. As três irmãs e o também irmão Branwell, eram os quatro muito próximos e, desde de crianças, eles tinham o hábito de criar histórias e mundos imaginários, o que foi decisivo para que as irmãs continuassem escrevendo depois de adultas. Vale lembrar que eles tinham ainda duas irmãs mais velhas que não escreviam e que morreram cedo.
As três irmãs mais novas começaram escrevendo poemas e só mais tarde se dedicaram aos romances. Como mulher não costumava ser escritora e também não era levada a sério, as três adotaram pseudônimos masculinos, mas, mesmo com os pseudônimos o laço de parentesco não se desfez, pois o sobrenome Bell, escolhido por elas, era comum a todas. A Charlote era a Currer Bell, a Emily adotou o nome de Ellis Bell, enquanto a Anne tornou-se Acton Bell. Percebam que os três nomes escolhidos tinham as mesmas iniciais dos nomes verdadeiros de cada uma delas.
Seu pai era um pastor severo, mas também amoroso e se dedicou aos filhos e à comunidade depois da morte da esposa.
O romance Jane Eyre, o primeiro de Charlotte e seu livro mais conhecido, figura entre muitas listas dos livros mais importantes de todos os tempos, graças a uma narrativa ágil, apesar de suas 400 páginas, e por traçar um fiel retrato da sociedade inglesa da época mas, ao mesmo tempo, um retrato crítico. E aí eu acho que reside a supremacia de sua qualidade sobre O Morro dos Ventos Uivantes. Nos dois livros, a história de amor é o fio narrativo, mas em Jane Eyre há uma construção de personagens e contexto mais complexa. A história de amor não é o que a autora acredita ser o mais importante.
Jane Eyre conta a história de uma menina órfã que vai viver com o seu tio. Entretanto, o tio também morre cedo e, apesar de sua esposa lhe prometer que vai cuidar da sobrinha, a tia e os primos não gostam de Jane e não lhe tratam bem. Como a menina não tem muito controle sobre a língua, o que era um diferencial naquela época em que crianças não tinham voz, quanto mais ela reclama do tratamento recebido, mais castigada ela é.
Um dia, depois de ser maltratada pelo primo, e a tia, a Sra Reed, tomar o partido do filho, Jane é colocada de castigo, trancada em um quarto. O quarto vermelho como era chamado, assustava a menina porque era lá que seu tio tinha morrido. Apavorada, ela pensou ter visto alguma coisa estranha e começou a gritar que lhe tirassem dali. Ouvindo os gritos, a Sra. Reed apareceu, mas não quis suspender o castigo, tornando a trancá-la. Então a criança desmaiou e quando voltou a si ,estava doente e foi tratada por um boticário.
O castigo, ao invés de amansar Jane, a deixou ainda mais revoltada e não demorou muitos dias para que ela desacatasse a tia e fosse parar em um colégio interno. O colégio era para órfãs pobres e faltava tudo naquele lugar, principalmente, comida. O colégio interno na obra de Charlotte Brontë tem um significado especial porque ela, suas irmãs mais velhas, Elisabeth e Maria, além de sua outra irmã Emily estudaram em um colégio interno como o que ela descreve no livro. Foi também no colégio igual ao da ficção, que as irmãs mais velhas Elisabeth e Maria contraíram tuberculose vindo as duas a falecer logo depois. Tanto Charlotte como Emily também ficaram com a saúde abalada e só não morreram porque o pai as retirou da escola.
Então o internato já é uma crítica à sociedade daquela época que colocava órfãos em locais precários sem qualquer preocupação. Ao sair do internato, depois de oito anos, a personagem se emprega como governante em uma casa rica. Ela vai educar uma criança francesa. E essa ocupação também tem por base uma experiência real, já que tanto Charlotte como Emily, foram tutoras na Bélgica de crianças ricas.
O proprietário da casa onde Jane vai trabalhar, chamado Mr. Rochester, é um personagem inteligente, mas bastante duro e indelicado, entretanto, encontra em Jane uma interlocutora à sua altura. Claro que isso vai impressioná-lo e eles vão acabar se apaixonando. Porém, o relacionamento dos dois tem o impedimento da idade porque Mr. Rochester é muito mais velho do que Jane e também da condição econômica, pois enquanto ele e muito rico, ela não tem nada de seu. Mas isso seriam talvez obstáculos a serem transponíveis se ainda não houvesse um grande segredo a ser revelado.
Claro que eu não vou contar o resto da história, porque eu espero que você a leia. Apesar de ainda ter muitos elementos um pouco exagerados do romantismo presentes na narrativa, como coincidências bem forçadas, creio que Charlotte se supera ao construir uma personagem disposta a enfrentar a sociedade opressora em que vive, tanto por ser mulher como por ser pobre. Sua crítica deve ter feito eco em muitas leitoras e leitores daquela época. É o tipo de romance que deve ter lançado uma fagulha a comportamentos desprezíveis de uma sociedade rica e que não se importava com os mais pobres. Daí a sua importância. Mas, sobretudo, é um romance gostoso de ler. Em que a narrativa ágil cria muitos fatos que dão movimento à trama e ainda explora o mistério dos segredos, o que aguça nossa curiosidade.
Vídeo-resenha: https://www.youtube.com/watch?v=IOx_C2Xbf5g
FICHA TÉCNICA
Título Original – Jane Eyre - An Autobíography
Edição Original – 1847
Edição utilizada nessa resenha: 1956
Editora - Irmãos Pongetti Editores
Páginas: 402