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NOSSO PICA-PAU MORREU

        Ouço a notícia que o pica-pau da minha infância, o que me irritava, mas também me alegrava todos os dias com a sua risada escandalosa, desapareceu. Ele que sempre vencia o mais teimoso dos seres humanos que queria que ele parasse de furar a madeira, por fim, perdeu a batalha.

           Sumiu para sempre do planeta Terra!

          O mundo não parou. Um monte de gente nem ficou sabendo. Outras ficaram e nem se importaram e eu fiquei com esse vazio na minha infância.

       Reza a lenda que o desenhista e produtor de desenhos animados, Walter Lantz, estava com sua mulher em lua de mel em uma cabana de madeira nas montanhas dos Estados Unidos, quando um pica-pau-bico-de-marfim resolveu atormentar o casal com infinitas bicadas no telhado.                    Depois de tentar de tudo para que o animal parasse, Lantz fez o que seres inteligentes fazem: entendeu que o inimigo, na verdade, nem era um inimigo. O estranho ali, naquele lugar, era o casal apaixonado. Assim, seguindo o conselho de sua esposa, Lantz criou um dos desenhos mais assistidos de todos os tempos: o Pica-Pau.

        Sua crista vermelha, seu bico cor de marfim e o seu corpo negro na vida real, mas azul no desenho, vão estar para sempre na minha memória. Mas o que eu vou dizer aos meus netos, quando assistirmos juntos ao desenho antigo?

       Como vou explicar que o simpático e endiabrado animal simplesmente desapareceu porque nós humanos acabamos com o seu habitat?

       O pior é que não foi só ele. Junto com o pica-pau-bico-de-marfim desapareceram da face da Terra, mais onze tipos de pássaros, duas espécies de peixe, além de vários mexilhões. Tudo declarado extinto de uma única vez.

       O Pica-Pau foi o primeiro desenho a ser exibido na televisão brasileira, no dia seguinte à inauguração da TV Tupi, em setembro de 1950. Seu aparecimento fez um barulho danado, entretanto, seu desaparecimento não conseguiu fazer barulho nenhum, como gostava tanto o Pica-Pau.

       No desenho, Pica-pau era muito esperto, defendia o que era seu e só fazia aquilo que queria. Mas o mundo dos desenhos é apenas como gostaríamos que o mundo fosse. Ainda teremos que ver muitas espécies desaparecerem para que a humanidade entenda que a vida é finita.

 

São Paulo, 05/10/2021

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