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         O ALIENISTA

          Para começarmos a falar sobre O Alienista de Machado de Assis é preciso iniciar pelo termo alienista. O que significa? Significa um médico que cuida de alienados mentais. Por isso, que muitas vezes nós escutamos ou até mesmo falamos de forma pejorativa para ofender alguém que: fulano é um alienado. Quer dizer, é uma pessoa que não compreende a realidade em que vive ou de interessa mais por frivolidades do que com aquilo que é importante. Nesse caso, nós trouxemos esse termo da medicina, os alienados mentais, os loucos, para utilizar no nosso dia a dia.

          O Alienista não é um romance e sim um conto, um conto grande com quase cem páginas, mas é um conto. Alguns críticos o consideram uma novela, mas preferimos a designação que o próprio Machado lhe deu que foi de conto. Ele foi publicado pela primeira no século XIX, em uma antiga revista carioca chamada A Estação e depois reunido por Machado, juntamente com os outros contos para formar um volume chamado Papéis Avulsos.

          No prefácio dessa edição, Machado diz que os escritos são avulsos, mas não são completamente estranhos como passageiros em uma hospedaria, mas, pelo contrário, diz que seus escritos “são pessoas de uma só família que a obrigação do pão fez sentar à mesma mesa”. Ou seja, foram reunidos com o intuito de serem publicados e de renderem frutos ao seu autor.

          Como que se desculpando por serem contos e não um romance, Machado diz: “quando se faz um conto, o espírito fica alegre, o tempo escoa-se e o conto da vida acaba, sem a gente dar por isso.” Ou seja, ele entendia que o conto era um entretenimento, algo que fazia o tempo passar mais rápido.

           E do que se trata O Alienista?

        É a história do médico Simão Bacamarte, de uma família rica que estudou na Europa, mas que com 34 anos voltou ao Brasil para clinicar em Itaguaí, na época, uma pequena cidade na região metropolitana do Rio de Janeiro. Ele era um estudioso da ciência e se dedicava a isso de corpo e alma. Aos 40 anos, ele se casa com D. Evarista, uma mulher nem feia, nem bonita, mas que o Dr. Bacamarte achou que tinha uma boa estrutura física e que podia lhe dar bons filhos.

          O problema é que D. Evarista não conseguiu engravidar. O Dr. Bacamarte então, estudou profundamente o assunto, escreveu para universidades estrangeiras para solicitar estudos e chegou até a recomendar uma dieta exclusiva de carne de porco para ver se a mulher engravidava, mas nenhum de seus esforços deu resultado.

        Bacamarte, depois dessa decepção, mergulhou de corpo e alma no estudo e na prática da medicina. Ele percebeu que, em todo reino (não nos esqueçamos que a história se passa quando o Brasil ainda era uma monarquia, por isso a palavra reino), não havia nenhum médico especializado em doenças mentais, e ele resolve se dedicar a esse ramo da medicina.

         Naquela época, não havia em Itaguaí, um manicômio. Os loucos eram trancados em casa pela família e pronto, sem qualquer tratamento. Simão Bacamarte resolve então construir uma clínica de loucos na cidade. Para isso, vai à câmara de vereadores fazer a solicitação e defende com tal convicção seu pedido que ele acaba aceito e a casa de loucos sendo construída.

        Como todas as janelas da nova casa eram verde, Casa Verde foi o nome escolhido para o manicômio e assim, Itaguaí passa a ter sua casa de Orates, como é dito no conto, lembrando que orate nada mais é do que sinônimo de louco, de maluco.

       Desta forma, Simão Bacamarte começa, não apenas a cuidar dos loucos, mas a estudar profundamente a loucura. Ao boticário, Crispim Soares, que é seu amigo, ele vai contando sobre as conclusões que ele vai chegando.

          Em pouco tempo, chegam loucos de várias cidades próximas e a Casa Verde fica cheia de pacientes.

       O interessante é que não apenas loucos com deficiência mental passam a ser estudados por Simão Bacamarte, mas também outros tipos de comportamento como, por exemplo, os chamados “loucos de amor”. Dr. Bacamarte estudava sem parar os hábitos dos loucos, as palavras, os gestos, os medicamentos, os meios curativos e tudo isso passou a ser o centro de sua existência, falando cada vez menos com D. Evarista, sua esposa.

         Para compensar a esposa que reclamava sua presença, ele mandou-a para o Rio de Janeiro passear e continuou suas pesquisas científicas. Passou a andar pela cidade fazendo perguntas pelas casas, até que um dia contou ao boticário Crispim e ao vigário Lopes que tinha uma nova teoria e que a loucura era um estado muito maior do que ele imaginava e que havia muitos mais loucos do que ele, anteriormente, supunha. Para  Simão Bacamarte, os limites entre a razão e a loucura tinham de ser muito bem delimitados, e tudo que escapasse um pouco à razão, seria loucura.

      Com essa teoria em mente, Dr. Bacamarte começou a recolher à força todo habitante de Itaguaí que ele considerasse louco. Se alguém quisesse dispor de seus bens, como um milionário da cidade chamado Costa, Bacamarte achava que ele estava louco. Se a prima do milionário fosse ao manicômio reclamar da internação do primo, o médico também a considerava louca, e também a trancafiava no manicômio.

         As pessoas de Itaguaí que respeitavam Dr. Bacamarte não ousavam duvidar de seus diagnósticos, mas quando ele começou a internar um homem que todo dia admirava sua casa porque achava que isso era loucura, ou os loucos de amor e tantos outros com pequenas excentricidades, os habitantes da cidade começaram a perceber que havia algo errado. Em pouco tempo, muitas pessoas foram internadas, sem muito critério,

       Quando dona Evarista voltou do Rio, e o Padre Lopes lhe contou das muitas internações, ela ficou espantada como tantas pessoas ficaram doidas em tão pouco tempo.

        As internações continuaram até que o barbeiro Porphirio reuniu cerca de trinta pessoas e juntos levaram uma representação à Câmara de Vereadores, reclamando de Dr. Bacamarte, que a recusou. Apenas um vereador, Sebastião Freitas, fez esta reflexão;

         - Se tantos homens em que supomos juízo são reclusos por dementes, quem nos afirma que o alienado não é o alienista?

          Assim, o grupo do barbeiro resolveu marchar até a Casa Verde pedindo seu fim. O alienista calmamente falou com eles da varanda dizendo que não tinha de dar satisfação de seus atos a leigos. A multidão se agitou, e a guarda foi chamada, mas, para espanto de todos, uma parte da guarda se juntou aos rebeldes e a outra parte não teve coragem de combater seus próprios soldados. Em seguida, foram todos à Câmara, destituíram os vereadores e o barbeiro Porphirio assumiu o governo da vila.

        Para surpresa do alienista, Porphirio disse a ele que não queria demolir a Casa Verde, mas apenas soltar alguns doentes quase curados. O Alienista disse que iria pensar no assunto.

        No dia seguinte, sabedores da revolta no reino, chega a Itaguaí, uma força do vice-rei, que restabelece a ordem. Em seguida, Bacamarte interna o barbeiro Porphirio e também seu antigo amigo Crispim porque o boticário havia se passado para o lado dos revoltosos, além de cerca de cinquenta aclamadores do novo regime. A partir daí, o Alienista não parou mais, internando todo mundo, inclusive, sua esposa.

         Um dia, para surpresa da população que ainda não tinha sido internada, Dr. Bacamarte manda à Câmara um ofício dizendo que verificara que quatro quintos da população estava internada na Casa Verde e que, diante de tais números, revira sua teoria e que devia admitir como normal e exemplar o desequilíbrio das faculdades e que portanto iria soltar as pessoas. Sua nova teoria era que os que não tivessem nenhum desequilíbrio é que deveriam ser internados.

          Assim, o alienista começou a internar pessoas de perfeição moral como a esposa do boticário e o vigário. Ele os internava e a terapia era tentar corrompê-los. Assim que o conseguia, Bacamarte os considerava curados. Em cinco meses, não havia mais ninguém na Casa Verde. Entretanto, começou a pensar sobre si próprio e convocou um conselho de amigos para lhes perguntar de seus defeitos. Os amigos disseram que ele não tinha nenhum, o que fez com o médico se autointernasse na Casa Verde. Ao cabo de dezessete meses ele morreu, sem ter conseguido se curar.

            Essa é a história que traz um retrato apurado da sociedade. Machado demonstra um ditado antigo que diz que “de médico e de louco, todo tem um mundo tem um pouco”. Ou seja, quem nunca fez alguma coisa que escapasse à razão em um momento de raiva, ou de muita dor? O Alienista mostra que a fronteira entre o equilíbrio e o desequilíbrio é muito tênue, e que não é difícil qualquer pessoa ultrapassar essa fronteira, mas nem por isso devemos ser considerados loucos, pois é próprio da natureza humana. A perfeição é que não existe.

         O Alienista é um bom exemplar da obra de Machado de Assis que mostra através de uma situação ficcional, como os homens enxergam os próprios homens. E como esse olhar muitas vezes se sobrepõe a realidade. É como se fosse mais importante o que os homens enxergam do que o que realmente acontece. Essa posição também aparece em outro conto famoso do autor que é O Espelho.(vide resenha aqui no site)

          Em resumo, O Alienista é um conto da fase realista de Machado de Assis e que tem como características principais, a crítica à sociedade, tentando trazer à tona a discussão do que é normal e o que não é, e a análise psicológica. O narrador é em terceira pessoa, aquele narrador que nós chamamos de onisciente, que tudo vê e tudo sabe.

Vídeo resenha:

FICHA TÉCNICA

Título Original – O Alienista

Edição Original – 1882

Edição utilizada nessa resenha – 1950 – Machado de Assis Obras Completas  

Jackson Editores – Rio de Janeiro

Número de páginas – 102

 

Vídeo-resenha: https://www.youtube.com/watch?v=aAafWjpL8Oo

 

FICHA TÉCNICA

Título Original – Infância

Edição Original – 1945

Edição utilizada nessa resenha – 1995

Editora Record/Altaya – Rio de Janeiro

Número de páginas – 266

Capa O Alienista.jpg
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