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SAUDADE FORA DE MODA

        Pessoas queridas se perdem no caminho. Por quê? Porque os caminhos são muitos e muitas vezes, estreitos.

            Sinto uma saudade imensa do que não vivi ao lado de pessoas queridas.

           Um sabor, um cheiro, um fato corriqueiro, fazem com que eu me lembre. Sempre me pergunto se elas também se lembram de mim, se também sentem saudade, se também gostariam de me ter ao seu lado. Sentimentos são vias de mão dupla, mas, muitas vezes, parecem que vivem em obras que só permitem a passagem de um a cada vez.

         Como todo ser que escreve, o ofício, constantemente, me faz parar para pensar nos detalhes, mas quem, em pleno século XXI, com tantas redes sociais, tem tempo para os detalhes? Deveria ter vivido no século XVIII. Escreveria longas cartas, farias poemas, contrataria cantantes para serenatas. Os amigos não estranhariam demonstrações tão efusivas de afeto e me responderiam da mesma forma.

          Em que momento demonstrar afeto, dizer que sente saudade, procurar alguém só pra falar de coisas sem importância saiu de moda? Às vezes, me sinto ridícula. Ridícula por demonstrar, mas também ridícula por esconder com medo de parecer ridícula.

        Lembro de alguém muito caro ao meu coração com quem não falo há anos. Tentei inutilmente manter o contato, se não semanal, pelo menos mensal, mas a pessoa não correspondeu. Comecei a achar que não deveria insistir e as semanas se tornaram meses que se tornaram anos. De vez em quando, recordo de tantos momentos de intimidade que eu acreditei ser de uma amizade indestrutível. O que aconteceu? Será que só eu tenho essas lembranças? Será que só para mim foram importantes? O que faz com que alguém não cultive o afeto?

           Pessimistas de plantão afirmarão sem questionar que essas pessoas, provavelmente, não gostavam de mim como eu gostava delas. Mas eu me recuso a acreditar. Creio em preguiça, em não saber como agir, em compromissos diários que tomam o tempo do amor, mas, principalmente, em pontes quebradas por alguma inundação ou completamente deterioradas pelo mato grande que invadiu o asfalto.

         Tenho alguns exemplos de pontes reconstruídas que hoje me trazem com regularidade seres amados. Alguém teve de colocar o primeiro metro de caminho. Não me importo de que seja eu. Costumam dizer que sou “facinha”. Meu orgulho termina à primeira demonstração de carinho. Não há problema. Às vezes, preciso de três ou quatro metros de reconstrução árdua, mas costuma dar certo. Não me arrependo. Nem sequer daquelas pontes que nunca consegui que chegassem à margem de lá. Até tentativas que não calam a perda sossegam um pouco a alma.

            No dia da saudade, o poeta me diz: “Quanto amei ou deixei de amar é a mesma saudade em mim.”

                                   

                       São Paulo, 30 de janeiro de 2021.

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