
Miriam Bevilacqua
Literatura, Comunicação,Educação
VISITANTES ESTRANHOS

Minha mãe acreditava cegamente que quando o pássaro anu-preto cantava em nosso telhado, ele estava avisando que alguém ia morrer. Coincidência ou não, várias vezes o pequeno pássaro acertou, inclusive, na morte de meu pai.
Na casa onde moro há algumas décadas, também já tive os mais estranhos visitantes. Já estou acostumada com os saguis pulando entre as plantas mais altas ou o feio saruê andando no muro e, para meu desespero, rasgando sacos de lixo. Eles têm certeza que moram comigo, e quem sou eu para contrariar?
Certa vez, em um longo período de chuvas, quando os armários já estavam com marcas de mofo e as roupas cheiravam mal, ouvi um chiado estranho no jardim. Para minha absoluta surpresa, vindo de algum lugar que eu não imagino onde seja, lá estava um sapo coaxando feliz. Para ser sincera, podia ser uma rã. Não sei. Nunca soube diferenciar um do outro. Não importa. Não fiz nada. Não ia sair na chuva para espantar um sapo. Ele que coaxasse quanto quisesse. Quando a chuva finalmente passou, o sapo sumiu junto com ela. Sem qualquer explicação!
Pouca gente sabe, mas morcegos fazem suas necessidades enquanto voam. Pois é. Eu também não sabia, até uma família de morcegos resolver se mudar para o meu telhado. Minhas paredes transformadas em privadas tiveram de ser limpas e pintadas. Expulsei a família sem dó!
Tucanos são animais muito bonitos, eu sei. Também sempre achei. E nas primeiras vezes que um tucano arrancou as sementes de minha palmeira e resolveu comer na beirada da janela do meu quarto ao amanhecer, foi realmente algo mágico. Mas depois da décima vez me acordando, batendo o bico no vidro enquanto abria as sementes, não achei mais um pássaro assim tão simpático. Dei graças a Deus quando a palmeira teve de ser cortada.
Minha última visita esquisita aconteceu na semana passada. Um enorme urubu andou dias batendo com toda força seus pés no telhado, até que em um determinado momento resolveu aterrissar no meu quintal para beber água. Devo admitir que levei um susto ao vê-lo tão de perto e congelei. Achei que ele ia voar, fugir de mim, mas nada. Ele ficou me olhando, quase que me desafiando. E eu fui dando ré bem devagarzinho, bem medrosa, até entrar em casa novamente.
O urubu ainda anda por aqui e já estou conformada em dividir meu quintal, o tempo que ele desejar. Visitantes estranhos vêm e vão e não adianta colocar vassoura atrás da porta pra visita ir embora rápido. Decididamente, meus visitantes não obedecem essa simpatia.
SP 23/09/25